COMPARTILHAMENTO DE DADOS DE USUÁRIOS DE TELEFONIA COM IBGE – STF

O Supremo Tribunal Federal começou a julgar ontem os referendos das medidas liminares concedidas em cinco Ações Diretas de Inconstitucionalidade  ajuizadas contra a Medida Provisória 954/2020, que prevê o compartilhamento de dados de usuários de telecomunicações com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -IBGE para a produção de estatística oficial durante a pandemia da Covid-19.

A relatora, ministra Rosa Weber, votou pela manutenção ​da suspensão da eficácia da MP 954/2020 e o julgamento será retomado na sessão extraordinária de hoje, dia 7 de maio.

As Ações Diretas de Inconstitucionalidade  interpostas possuem um argumento comum que a MP, ao obrigar as empresas de telefonia fixa e móvel a disponibilizar à Fundação IBGE a relação dos nomes, dos números de telefone e dos endereços de seus consumidores, pessoas físicas ou jurídicas, viola os dispositivos da Constituição Federal que asseguram a dignidade da pessoa humana, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e o sigilo dos dados.

A ministra Rosa Weber, ao conceder a medida liminar observou que as informações previstas na MP, relacionadas à identificação de pessoa natural, configuram dados pessoais e integram o âmbito de proteção das cláusulas constitucionais que asseguram a liberdade individual, a privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade. Desse modo, sua manipulação e seu tratamento devem observar os limites delineados pela proteção constitucional.

Outro ponto importante destacado pela relatora, foi a falta de delimitação na MP do objeto da estatística a ser produzida, a finalidade específica e a sua amplitude. Também não esclarece a necessidade de fornecimento dos dados nem como serão efetivamente utilizados e se é possível extrair das estatísticas a serem produzidas uma relação com a pandemia.

Outra constatação assinalada pela relatora é que a medida provisória não apresenta mecanismo técnico ou administrativo para proteger os dados pessoais de acessos não autorizados, vazamentos acidentais ou utilização indevida. Assim sendo, não satisfaz as exigências da Constituição em relação à efetiva proteção de direitos fundamentais.

A Ministra ressaltou que, embora não se possa subestimar a gravidade da crise sanitária nem a necessidade de formulação de políticas públicas que demandam dados específicos para seu enfrentamento, o seu combate, todavia, “não pode legitimar o atropelo de garantias fundamentais consagradas na Constituição”.

Ao concluir o voto, a ministra Rosa Weber destacou que não questiona a relevância, a seriedade e a legitimidade do trabalho desempenhado pelo IBGE ao produzir dados e informações estatísticas com qualidade técnica. Observou, no entanto, que exigir que a edição de normas que envolvam direitos fundamentais e da personalidade observe requisitos mínimos de adequação constitucional “não pode ser lido como embaraço a atividade estatal”.

Fato é que na MP estão ausentes a fundamentação motivada ao uso compartilhado dos dados em questão, bem como uma definição específica da finalidade e da necessidade do tratamento de dados a ser realizado.

O compartilhamento de dados entre entidades do setor privado e o setor público precede de uma motivação fundamentada, através da exposição das razões pelas quais se acredita que aquele conjunto de dados é essencial para a implementação de uma política de saúde pública a ser adotada a partir do tratamento dos dados, bem como das evidências empíricas de que a utilização dessas informações são essenciais para tomada de decisões de medidas de distanciamento social e outras para a contenção da Covid-19.

A finalidade é elemento essencial para um controle de desvio e para garantir que o tratamento seja adequado e não excessivo.

Com as incertezas provocadas pelo novo coronavírus, o momento é realmente atípico e o governo tem tomado um conjunto de medidas para garantir uma melhor saúde aos cidadãos. No entanto, o direito Constitucional à privacidade não pode ser prejudicado mediante um pedido de compartilhamento sem a devida fundamentação que ateste a necessidade e eficácia da medida.

Em um momento como o que vivemos, faz ainda mais necessária a vigência da Lei Geral de Proteção de Dados, pois seria um norte dessas políticas públicas. Vamos acompanhar hoje a finalização do julgamento!

Por Adriana Giuntini

Giuntini Advocacia